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Na Era da Humanidade, o papel decisivo do público na sobrevivência do planeta

por Carlos Alberto Rocha *

Há 20 anos, o Nobel de Química Paul Crutzen definiu o termo Antropoceno como um novo estágio no tempo geológico, que passou a atribuir à humanidade a devida importância nos processos de transformação da Terra. Deixando o Holoceno para trás — que para os puristas da geologia é o atual período geológico  —, para Crutzen, o que também se tornou conhecido como a Era da Humanidade teve início no princípio do século 19, quando, a partir da Revolução Industrial, a humanidade passou a utilizar a energia contida nos combustíveis fósseis.

Mesmo com a moda negacionista embaçando a visão de grande número de pessoas, os estudos científicos não deixam dúvida sobre o peso de transformação que, de lá pra cá, a humanidade passou a exercer sobre o nosso planeta. Muito além das evidências gritantes dos incêndios no Pantanal, na Amazônia e até na Serra da Moeda, aqui pertinho de Belo Horizonte, sobre os quais recaem fortes indícios da ação humana, as mudanças climáticas, a acidificação dos oceanos, a extinção de biomas inteiros, entre vários outros problemas que têm afetado o meio ambiente ao longo da história, denotam o quanto a nossa espécie se tornou prejudicial ao planeta.

Mas, em que medida nós, cidadãos, podemos agir para que a Era da Humanidade não se transforme na era da destruição da nossa própria espécie e de tantas outras com a qual compartilhamos o ambiente natural? Como podemos agir contra a onda de destruição que está se tornando cada vez mais violenta? Muito se fala em mudanças de comportamento e em consumo consciente, entre tantas outras ações individuais e coletivas que poderíamos adotar. Mas, será que tudo isso seria suficiente para brecar o desastre que está em pleno e acelerado processo?

Pressão pública

Buscando uma resposta mais simplificada e óbvia, poderíamos dizer que sim. Desde que as atitudes positivas sejam adotadas em escala planetária, podemos evitar o pior. Contudo, para que isso aconteça, será fundamental que o público esteja bem informado sobre a real situação na qual vivemos e, a partir desse ponto, que possa agir para reverter a catástrofe que alguns especialistas dizem ser iminente.

Para o professor de Comunicação Matthew Nisbet, da Northeastern University, nos Estados Unidos, a gravidade das ameaças que vivemos no presente crescem a uma taxa que excede em muito os esforços políticos para enfrentá-las, frustrando cientistas e ambientalistas, além de todas as demais pessoas que percebem que o enfrentamento da situação é urgente. Nisbet entende que a falta de conhecimento e de atenção do público figura entre os principais fatores que são responsáveis pela inação da classe política diante dos problemas ambientais.

Em artigo publicado no The Conversation, Nisbet destaca a defesa que os ambientalistas fazem sobre a necessidade de o público ser informado a respeito do consenso que há no meio científico quanto às mudanças climáticas. Uma vez informada, a sociedade poderia, inclusive, pressionar a classe política para que as ações positivas sejam adotadas. “Somente sob essas condições é que os governantes eleitos – enfrentando a pressão de seus eleitores – têm probabilidade de adotar medidas políticas significativas”, diz Nisbet.

O professor ressalta que, com este objetivo de oferecer ao público uma informação especializada, milhões de dólares têm sido gastos em ações de comunicação que visam rivalizar com outras que negam a grave situação ambiental que vivemos. Porém, no mesmo artigo, Nisbet nos apresenta um ponto de contradição ao questionar, com base na visão científica, se a opinião pública é, de fato, tão importante para os processos de mudança que são necessários para conter o avanço da catástrofe que está em andamento na Terra.

Contraditório

De acordo com o professor Nisbet, os cientistas políticos discordam do fato de a opinião pública desempenhar papel tão relevante nas decisões políticas no que diz respeito às questões ambientais. Se referindo a estudos realizado por pesquisadores da Simon Fraser University, dos Estados Unidos, que buscaram a opinião pública referente a medidas adotadas para a contenção das emissões de gás de efeito estufa, Nisbet revela que, como conclusão, foi percebido que a consciência da existência de políticas climáticas positivas e o conhecimento da eficácia destas políticas não estão associados a um maior apoio dos cidadãos a elas.

De acordo com a pesquisa citada por Nisbet, o fornecimento de informações especializadas teve pouco impacto direto sobre o apoio público aos resultados das medidas adotadas. Para os pesquisadores, a opinião pública estaria mais propensa a ser guiada por outros valores concorrentes, relacionados a visões de mundo e de uma “boa sociedade”, que incluiriam crenças culturais e intuições morais sobre a natureza, risco, progresso, autoridade e tecnologia.

Diante desta conclusão, então, podemos supor que o senso comum tenha muito mais peso sobre a opinião pública do que os estudos científicos.

Público consciente

Nisbet observa ainda que os estudos revelam que as decisões políticas de bastidores, muitas vezes, têm muito mais peso sobre as ações efetivas do que a própria opinião pública. Daí, podemos obter outra suposição: uma vez empossados, os políticos passariam a ser movidos muito mais pelas circunstâncias da política em si do que sobre o que pensam os eleitores.

Ora, ainda que os cientistas políticos percebam que o cidadão quando assume o poder político talvez não seja mais tão permeável à opinião pública quanto era antes de ser eleito, a conclusão não invalida a importância de as pessoas se tornarem mais bem informadas, de preferência, por meio de informações geradas por especialistas nas questões ambientais e nas tantas outras que são de interesse da sociedade. Com base em informações que tenham boa qualidade, o público talvez se torne mais crítico diante dos valores defendidos por aqueles que se propõem a assumir cargos públicos.

Portanto, na Era da Humanidade, há um reforço da importância de o conhecimento respaldado por estudos consistentes — e não por falácias de fakenews — ser amplamente distribuído ao público. A partir deste conhecimento torna-se mais provável que a sociedade se torne apta a eleger pessoas verdadeiramente comprometidas com as causas ambientais e com outras de interesse público e que não se tornarão alheias a elas quando forem eleitas.

* editor do Comunidade Ativa e presidente da Amoran, Carlos Alberto é jornalista e especialista em Educação Ambiental

 

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