Tecnologia

Hora de aliviar o estresse causado pelo WhatsApp

 

De salvação do tédio a motivo de estresse, as conversas pelos grupos de aplicativos, como o WhatsApp, passaram por uma transformação radical ao longo da pandemia. Pelo menos, esta é a conclusão do repórter Bryan Lufkin, da BBC, que ouviu alguns pesquisadores do assunto.

De acordo com o próprio repórter, ele começou a perceber que a graça inicial de se sentir próximo das pessoas, aos poucos, foi se transformando em ansiedade por não conseguir interagir com todas elas no tempo de resposta que elas exigiam. “Eu me senti culpado por não responder a uma mensagem de imediato ou por não abrir uma conversa do grupo. Também não conseguia inventar uma boa desculpa – o que eu iria dizer: ‘Desculpe, não entendi sua mensagem, estava muito ocupado em casa sem fazer nada pelo oitavo mês consecutivo’?” ele conta.

O repórter destaca que discussões em grupo sempre causaram ansiedade em algumas pessoas , mesmo antes da pandemia. Porém, agora, surge outro fenômeno interessante: pessoas que antes nos confortavam presencialmente começaram a provocar uma sobrecarga social quando a interação passou a ser por mensagens em aplicativos. Ora, se estas pessoas nos consolam e se conectam conosco em uma crise, por que alguns de nós nos sentimos exaustos e oprimidos por elas?

Dívida de comunicação

As mensagens de texto são casuais, imediatas e há pesquisas indicando que gostamos mais delas do que de e-mails . No final de março de 2020, por exemplo, o WhatsApp já havia relatado um aumento de 40% no número de usuários. Um estudo realizado em setembro, que envolveu mais de 1.300 adultos norte-americanos, mostrou que o uso de comunicações digitais de todos os tipos aumentou durante a pandemia, com as mensagens de texto liderando, dando um salto de 43%.

“Temos sorte de ter esse tipo de tecnologia. Sem Zoom, Slack e WhatsApp, a pandemia seria uma experiência muito mais solitária. Mas as plataformas de chat em grupo vêm com um imediatismo e intimidade que podem fazer com que participar delas pareça estressante”, avalia Lufkin. Com base nas análises do psiquiatra Elias Aboujaoude, da Universidade de Stanford, na Califórnia, que é especialista na interseção entre a tecnologia e a psicologia, o repórter destaca a necessidade que temos de ler uma mensagem em tempo real e, ao mesmo tempo, de respondê-la também em tempo real como sendo motivos que nos levam a ficar estressados com os aplicativos.

Além disso, Lufkin também considera a observação do pesquisador Bernie Hogan, do Instituto de Internet da Universidade de Oxford, a respeito do grande número de mensagens que se acumulam rapidamente no celular quando deixamos de acessá-lo por um tempo. Para Hogan, antes que você perceba, as mensagens de texto começam a parecer tão complicadas quanto as que chegam por  e-mail .

Reflexo condicionado

Bryan Lufkin lembra que o estresse não é provocado somente pelos grupos, uma vez que a tecnologia em si cria as condições para que situações estressantes se formem. “Já sabíamos que ficar grudado em nossos telefones e computadores fazia mal à saúde . Dependendo da tecnologia, todas as nossas necessidades de comunicação social podem aumentar nossa carga cognitiva – algo que já está sob pressão crescente na pandemia”, considera o repórter.

Para Lufkin, há ainda o esgotamento que as notícias sobre a pandemia têm provocado. “Embora no início possamos ter gostado dos artigos que nossos amigos compartilharam enquanto nos esforçávamos para entender os impactos da Covid-19, em seguida começamos a temer o fluxo de atualizações que alimentam a ansiedade” diz o repórter.

Esta é uma ideia corroborada pelo psiquiatra Aboujaoude .“No início da pandemia, os bate-papos em grupo podem ter parecido uma boa maneira de sentir pena de muitas pessoas ao mesmo tempo. Você poderia contar com todos no grupo tendo essa experiência estressante em comum com você. O problema, logo ficou claro, é que o estresse e a ansiedade que às vezes vêm com mensagens de texto individuais aumentam exponencialmente em bate-papos em grupo”, diz Aboujaoude.

Acrescente a isso o sobressalto que as notificações provocam e surgirá outro motivo de estresse. Na virada do século 19 para o 20, o fisiologista Ivan Pavlov, descobriu o chamado “reflexo condicionado”, que está associado à reação que temos diante de determinados estímulos recebidos. Como de uma notificação de celular, por exemplo.

Para a psicóloga Vaile Wright, diretora sênior de Inovação em Saúde da Associação Americana de Psicologia, mesmo que você consiga distinguir as diferentes notificações que recebe é possível que surja algo próximo a uma resposta pavloviana, na qual apenas aquele seja suficiente para desencadear uma ansiedade. Para Vaile, uma simples notificação pode ser associada a ocorrência de algo terrível, mesmo que nada tenha acontecido.

Desligar

Imagine a seguinte situação: a avó de alguém, que mora sozinha, descobriu que o bate-papo em grupo é a única opção para se conectar com as pessoas e ela passa a usar este expediente constantemente, como válvula de escape para a própria ansiedade. Ao mesmo tempo, os amigos de faculdade, que estão lutando contra o home office, contra o cansaço do Zoom e, ao mesmo tempo, tentando gerenciar o estudo dos filhos em casa, também resolvem dar as suas escapadas mais ou menos frequentes para o grupo da turma.

Ou seja, são várias experiências distintas que as pessoas descarregam sobre os grupos e que aumenta o volume de conexões. “O nível de fadiga que eu acho que muitas pessoas estão experimentando pode, simplesmente, tornar impraticável participar de um bate-papo em grupo”, considera Vaile. Diante dessa possibilidade, a psicóloga entende que as pessoas realmente não precisam ter uma desculpa para não mandar mensagens de texto para alguém imediatamente e isso não deve significar um problema.

Para Vaile, manter as coisas sob controle para salvaguardar o próprio bem-estar mental deve ser a prioridade, nem que isso signifique ter que desligar notificações, silenciar tópicos ou se ausentar de um bate-papo em grupo por um tempo. A psicóloga considera que, mesmo que os sentimentos de algumas pessoas sejam feridos momentaneamente, é crucial estabelecer limites.

O psiquiatra Aboujaoude ressalta que os aplicativos de mensagens podem ser ótimos para atualizações rápidas ou para o compartilhamento de memes engraçados. “Mas realmente não se prestam a compartilhar aspectos importantes de nossas vidas, fornecendo suporte emocional, compartilhando uma risada ou um bom choro”, ele diz. Para Aboujoule, as chamadas telefônicas oferecem mais oportunidades para as pessoas se conectarem em nível emocional.

De fato, há uma pesquisa que mostra que a comunicação por voz — em oposição à comunicação visual apenas — aumenta a empatia e a capacidade de sintonizar com as emoções da outra pessoa, permitindo uma conexão mais profunda. Então, se você realmente está precisando conversar com alguém, talvez seja mais interessante e menos estressante fazer isso por telefone.

Enquanto isso, é mais interessante reservar o WhatsApp para receber e enviar assuntos relevantes, em mensagens curtas e objetivas.


Uma dica

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