Cultura

Com o apoio de moradora do Anchieta, a poeta que aprendeu a ler aos 51 anos lança o primeiro livro

Este poderia ser o enredo de um belo romance ou o roteiro para um filme de sucesso. Contudo, felizmente, a história que tem como protagonista a aposentada Maria da Conceição Paulo, a Pretinha, e como coadjuvante essencial a geógrafa Lígia Nassif é bastante real.

Moradora do bairro Alto Vera Cruz, Região Leste de BH, Pretinha encontrou em Lígia, que mora no Anchieta, o apoio que precisava para realizar o desejo de publicar um livro. Com isso, ela coroou uma trajetória daquelas que fazem com que a gente ainda acredite no ser humano e no poder de transformação que há no desejo e na força de vontade para realizá-lo.

Infância difícil e superação
Aos 76 anos, Pretinha lançou o seu primeiro livro com o apoio da incentivadora de sonhos Lígia Nassif (Foto: Lígia Nassif)

Tudo começou na infância de Pretinha, que foi vivida entre muitas dificuldades. Ainda criança, ela ficou órfã de pai e de mãe, foi adotada, sofreu maus-tratos e, com isso, sequer foi alfabetizada. Ora, estavam criadas todas as condições que, muitas vezes, levam as pessoas para o lado ruim da vida.

Porém, não foi o que aconteceu com Pretinha. Mesmo diante de tantas barreiras, ela seguiu em frente e construiu uma vida muito digna. Casou-se, teve filhos, deu a eles o acesso aos estudos que não recebeu e, em meio a tudo isso, ainda achou tempo para trabalhar como cozinheira e enfermeira.

De fato, para muitas mulheres de sua geração e que tiveram trajetórias semelhantes, estas conquistas seriam suficientes para que elas se sentissem realizadas. Contudo, para Pretinha ainda havia muito a ser feito. Ela precisava estudar, precisava aprender a ler e a escrever. Mais do que isso, precisava compor poesias e, ainda, queria muito publicar um livro.

A alfabetização veio quando Pretinha já estava com 51 anos. As poesias ela começou a escrever em cadernos quando já tinha por volta dos 65, o que fez ao longo de dez anos. Durante um bom tempo, a aposentada também foi juntando dinheiro para — um dia, quem sabe? — financiar a publicação da sua coletânea de poesias.

Porém, para que o desejo se realizasse ainda faltavam alguns detalhes. Foi então que Lígia entrou na história para ajudar a resolvê-los.

Incentivadora de sonhos

Em 2016, Lígia, que também é fotógrafa, havia se voluntariado para atuar no Grupo Cultural Meninas de Sinhá, que reúne senhoras do bairro Alto Vera Cruz em torno de várias atividades artísticas e culturais. Foi lá que conheceu Pretinha, que contou a ela sobre os cadernos de poesia e sobre o desejo que tinha de transformá-los em um livro.

Ao contrário do que ocorre com a maior parte dos projetos culturais brasileiros, não faltariam recursos para financiar a publicação, uma vez que Pretinha havia economizado o bastante para custear as despesas editoriais. Entusiasmada com a ideia, Lígia colocou em prática uma função que ela mesmo criou — a de incentivadora de sonhos — e logo ficou tudo acertado.

Em contato com a Páginas Editora, Lígia providenciou para que, ao longo de 2020, fossem selecionadas as poesias para a edição do livro, que ficou pronto no ano passado mesmo. Contudo, entre a impressão e o lançamento havia uma pandemia, que adiou os planos, mas não muito.

Finalmente, seguindo todos os protocolos de segurança, no último dia 13 de fevereiro, aos 76 anos, a poeta Pretinha lançou Jardim de Rosa-palavra, realizando todos os desejos que tinha.

O Jardim de Rosa-palavra

A consciência negra está presente na poesia de Pretinha em poemas como Lembrança, no qual ela diz: Não temos mais donos/somos nossos próprios donos. Está também em A raiz dos negros, que conta que Debaixo da chibatada, eles choravam e cantavam as suas culturas/Que beleza as plantações/E as negras criavam os filhos dos patrões.

Jardim de Rosa-palavra foi publicado com recursos próprios da escritora (Foto: Lígia Nassif/Divulgaçã)

Mas, nesse jardim não se ouvem somente os lamentos de um povo que foi escravizado. Nele também florescem loas ao amor, à amizade, à paz, ao lado bom da vida e à força que há nos sonhos de quem envelhece.

Na Globo

Antes mesmo do lançamento, Pretinha já havia se tornado uma celebridade. Na comemoração do Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro do ano passado, a poeta foi personagem do programa Encontro, com Fátima Bernardes, sendo apresentada como o exemplo de superação e de sucesso que foi dado pela mulher alfabetizada na maturidade e que escreveu um livro de poesia. No próximo sábado, dia 17, Pretinha estará de volta à Globo no programa Rolê das Gerais e mais uma vez terá a sua vida destacada.

Tudo isso, graças à força e ao talento que não faltam a ela e, em boa medida, graças ao apoio que encontrou na incentivadora de sonhos Lígia Nassif, que agora também faz as vezes de produtora da poeta.

Serviço
Venda do livro pelos seguintes canais:
• Instagram da autora: @pretinha_oficial71
• Pela produtora (Ligia Nassif): (31) 99171 3753
• Site da editora: https://www.paginaseditora.com.br
Valor do livro: R$ 39,00