Cidadania

A solidão na multidão – por Diorela Kelles

por Diorela Kelles 

Um estudo publicado pela revista Nature chamado “Solitário na multidão: investigando a associação entre superlotação e solidão usando tecnologias de smartphone”” (2021) definiu a solidão. A pesquisa conceituou o termo como o sentimento de angústia resultante de uma discrepância entre o contato social desejado e o contato social real.

Para realizar o estudo, foi desenvolvido um aplicativo para smartphone para investigar a relação entre viver em uma cidade e a solidão em tempo real. Um total de 16.602 avaliações foram concluídas por 756 pessoas globalmente, com cerca de 50% dos participantes localizados no Reino Unido e o restante na Europa, EUA e Austrália.

No Reino Unido, a pesquisa chegou ao resultado de que cerca de 45% das pessoas relatam sentir solidão – com 5% das pessoas experimentando solidão severa. Os relatos também indicaram que a solidão aumentou desde o início da pandemia de COVID-19. E os indicadores levaram a uma preocupação de que a solidão possa atingir proporções epidêmicas até 2030, a menos que algumas ações sejam tomadas. Aqui, notamos que temos alguns deveres para fora de casa, você percebe? Além de combater problemas ambientais que também são inquietantes, devemos nos atentar para não cairmos em solidão epidêmica.

A solidão pode ter um efeito profundo e prejudicial em nossa saúde mental e física. Não é incomum relacioná-la com outras condições como depressão, alcoolismo, declínio cognitivo e doenças cardíacas. Uma publicação do Fórum Econômico Mundial ainda nos adverte que, enquanto a poluição do ar, a obesidade e o uso excessivo de álcool aumentam o risco de morte em 6%, 23% e 37%, respectivamente, a solidão pode aumentar esse risco em até 45%.
E a mesma publicação sugere que, embora múltiplos fatores sociais, financeiros e tecnológicos estejam provavelmente em jogo, evidências crescentes levam a considerar que a rápida urbanização pode ser um fator de aumento da solidão.

Falemos das cidades então!

Mais da metade da população mundial vive em cidades, e este número não vai parar de crescer. No entanto, até 2021, sabíamos ainda pouco sobre como a vida urbana influencia nossa experiência de solidão.

Foi então que, com um aplicativo para smartphone para investigar a relação entre viver em uma cidade e a solidão em tempo real, usou-se a avaliação momentânea ecológica. Essa técnica faz o envio de prompts para os participantes em momentos aleatórios, convidando-os a responder perguntas sobre suas experiências atuais.

As perguntas incluíam onde os participantes estavam, como era o ambiente ao redor e como eles se sentiam naquele momento. Descobriu-se que estar em ambientes superlotados aumentava a solidão em até 38%. E esse efeito permaneceu significativo mesmo depois da consideração de uma variedade de fatores – como idade, gênero, etnia, nível de educação e ocupação.

Em contraste, a inclusão social percebida – o sentimento de estar com pessoas que compartilham nossos valores e nos fazem sentir bem-vindos – estava associada a uma redução de 21% na solidão. Daí, se entende algo importante: é a qualidade dos relacionamentos sociais que importa , não necessariamente a quantidade de contato social que temos.

Se a solidão é reduzida ao se sentir mais incluído socialmente, pode ser possível usar a prescrição social para ajudar a conectar pessoas com interesses semelhantes em suas comunidades locais – especialmente em cidades. Uma avaliação recente de um programa de prescrição social no Reino Unido indica que é uma maneira eficaz de levar a essa redução. O que pode ser especialmente benéfico para populações vulneráveis, como pessoas com mobilidade reduzida ou aquelas com problemas de saúde mental.

A forma também importa!
 
O mesmo estudo indicou que as pessoas apresentavam 28% menos probabilidade de se sentirem solitárias em ambientes urbanos com características naturais (com árvores, plantas e pássaros) em comparação com ambientes urbanos que não possuem essas características.
Se a solidão é reduzida pelo contato com a natureza, melhorar o acesso a espaços verdes e azuis de alta qualidade (como parques e rios) em áreas urbanas densas pode ajudar as pessoas a se sentirem menos solitárias. Pesquisas anteriores também mostram que a natureza pode beneficiar a saúde mental.O impacto dos espaços verdes na diminuição da solidão ficou evidente no estudo. E essas observações levam a uma conclusão: enquanto a solidão é uma experiência singular e pessoal, sua solução precisa ser coletiva, afetiva e ambientalmente engajada. Vamos juntos?

Para acompanhar o estudo em seu original, clique aqui.
Para ver a matéria original do Fórum Econômico Mundial, clique aqui.
Redatora, advogada e atriz,
Diorela é entusiasta do
direito à cidade