Tecnologia

Analistas de marketing querem usar a voz para revelar perfis individuais de consumo

“Para sua segurança, essa ligação está sendo gravada”. Esta é uma mensagem comum, com a qual já nos habituamos quando ligamos para alguma empresa para fazer uma reclamação, solicitar um serviço ou simplesmente pedir uma informação. De fato, por enquanto, é possível que este seja o real propósito naquele atendimento telefônico. Porém, em breve, pode não ser o único.

Com o uso da Inteligência Artificial (IA) associada à dispositivos de gravação de voz, analistas de marketing estão buscando no perfil vocal das pessoas as características de consumo que elas podem apresentar, e isso promete revolucionar as estratégias de venda em um futuro próximo.

Além da ficção

Imagine que você entre em contato com o call center de uma loja para obter informações sobre a entrega de um produto. Como de praxe, o atendente vai repetir o alerta com o qual já nos habituamos e a ligação será gravada, o que soará como algo bastante natural.

Entretanto, mais do que um registro da conversa que possa servir para solucionar dúvidas futuras com relação ao atendimento, dentro em breve, aquela gravação poderá ser enviada para um computador que tenha como função realizar a análise de voz, sendo capaz de distinguir as características da pessoa que fala. A partir das informações obtidas, então, o consumidor será direcionado para determinadas estratégias de atendimento e de marketing.

Parece ficção, mas há sinais consistentes de que isso está para acontecer de forma prática. Preparando o material para o seu próximo livro — The Voice Catchers: How Marketers Listen In to Exploit Your Feelings, Your Privacy and Your Wallet (Os Captadores de Voz: como os profissionais de marketing ouvem para explorar seus sentimentos, sua privacidade e sua carteira) —, o professor Joseph Turow, que leciona  Sistemas e Indústrias de Mídia na Universidade da Pensilvânia, nos Estados Unidos, descobriu que um futuro próximo do marketing está na análise de perfis de voz.

De acordo com Turow, graças à disponibilidade de recursos tecnológicos que já existem, os profissionais de marketing dizem estar prestes a usar a análise vocal assistida pela IA para alcançar resultados sem precedentes nas percepções sobre as identidades e nas inclinações dos consumidores. “Ao fazer isso, eles acreditam que serão capazes de contornar os erros e fraudes associados à publicidade direcionada tradicional”, destaca o professor em artigo para o The Conversation.

Contornando falhas

Segundo Turow, uma preocupação que há entre os anunciantes da internet está na inconsistência dos dados dos consumidores, que muitas vezes estão desatualizados ou que podem ser baseados em perfis confusos, obtidos a partir dos hábitos de vários usuários que usam um mesmo dispositivo. Além disso, pode haver erros no registro de dados e as pessoas podem simplesmente mentir sobre o que informam.

Turow destaca que os anunciantes também sofrem com o bloqueio de anúncios e com a fraude de cliques , situação que acontece quando um site ou aplicativo usa bots ou pessoas que são remuneradas para clicar em anúncios colocados ali, de modo que os anunciantes tenham que pagar. Com tudo isso, torna-se falha a possibilidade de traçar um perfil de consumo preciso.

Por outro lado, o professor considera que a análise de voz revela os sentimentos das pessoas e impede que elas fujam da própria identidade, uma vez que, como a impressão digital, as vozes são únicas. Este é um recurso extremamente valioso para os analistas de marketing.

Mas, nem tudo é perfeito

O levantamento conduzido por Turow , porém, descobriu que os perfis de voz não são 100% seguros para revelar com precisão as características de consumo ou outras que as pessoas possam apresentar. Ele destaca que, de acordo com a estudiosa do reconhecimento de voz da Carnegie Mellon, Rita Singh , a atividade dos nervos vocais está ligada ao estado emocional da pessoa e são suscetíveis de interferências que podem ser interpretadas de maneira equivocada. “Singh me disse que se preocupa. Com a facilidade de disponibilidade de pacotes de aprendizado de máquina, as pessoas com habilidades limitadas serão tentadas a fazer análises de má qualidade das vozes das pessoas, levando a conclusões que são tão duvidosas quanto os métodos”, diz o professor.

Turow considera ainda os riscos que as interpretações podem representar, sejam elas precisa ou não. “E se o perfil de voz disser a um possível empregador que você é um grande risco para um emprego que cobiça ou precisa desesperadamente? E se disser a um banco que você representa um grande risco para um empréstimo? E se um restaurante decidir que não aceita sua reserva porque você parece ser de classe baixa ou muito exigente?  Considere, também, a discriminação que pode ocorrer se os perfis de vozes seguirem as afirmações de alguns cientistas de que é possível usar as vocalizações de um indivíduo para saber sua altura, peso, raça, gênero e saúde”, alerta.

Portanto, estes são temas que precisam ser vistos pelo ponto de visa ético, inclusive pelos órgãos reguladores dos direitos do consumidor. Afinal, estamos tratando de um futuro que não está tão distante e, quando isso acontecer, talvez nossas vozes possam revelar muito mais sobre nós do que estaríamos dispostos a falar.

Uma dica

Para mais informações sobre os temas abordados nessa matéria, acesse os links disponíveis ao longo do texto. Eles remetem às fontes utilizadas aqui. 

Uma dica: os artigos fora da página do Comunidade Ativa que não estiverem em português podem ser traduzidos automaticamente pelo navegador pelo seu navegador. Pra isso, basta clicar com o botão direito em qualquer ponto do texto a ser traduzido e escolher a opção “Traduzir para o português”.